por Luiza Estima

No dia 9 de outubro vai acontecer o 2º Cafestival Poa – Festival dos Cafés Especiais de Porto Alegre, uma experiência completa com a bebida que é a segunda mais consumida no mundo, depois da água, apresentada pelos profissionais que compõem sua cadeia de produção: produtores, mestres de torra, baristas, especialistas, empreendedores.

“Café especial não é simplesmente um apelido carinhoso”, explica a jornalista Luiza Estima, do Café da Escrita, colab de conteúdo que faz a curadoria do espaço de cozinha do evento, onde vão acontecer oficinas com o café – análise sensorial, harmonizações com chocolate e queijo, receitas com café para comer e beber, drinques e uma oficina de escrita criativa sobre o tema café e viagens (veja a programação ao final). “Especial é uma classificação mundial e se refere àqueles cafés que recebem pontuação acima de 80”, Luiza prossegue, esclarecendo que isso é feito sob rigorosos critérios de avaliação estabelecidos pela associação internacional SCASpecialty Coffee Association.

A denominação café especial foi utilizada nos anos 1970 por uma mulher, nos Estados Unidos, a norueguesa Erna Knutsen – isso definiu o surgimento da associação e um novo rumo para a história do café no mundo. Erna era secretária de uma importadora de cafés em São Francisco, na Califórnia, e identificou a extrema qualidade em pequenos lotes de grãos de determinadas origens, classificando como “diamonds” os grãos que tinha como especiais. Erna, essa mulher empreendedora de paladar sensível prossegue na história do café especial e aparece em vários momentos da história de outras mulheres, aqui no Brasil.

Sem ser Especial, o cafezinho, queridinho do dia a dia dos brasileiros, pertence a outra categoria, que se divide em: Tradicional (mínimo 4,5 até 6 pontos), Superior (a partir de 6 pontos a 7,2) e Gourmet (acima de 7,3 até 10 pontos).

GURIAS

Mas por que o café e o Festival vieram parar no Fala Feminina? Bom, e por que não?

Isabela Raposeiras, empresária fundadora do Coffee Lab

A segunda edição do Cafestival acontece o dia inteiro, no domingo, das 9h às 19h, e apresenta 11 palestras e bate-papos em uma arena aberta ao público + seis oficinas na cozinha-show, para inscritos. Em todas as atividades a presença feminina chama a atenção tanto pela quantidade como pela qualidade – profissionais de destaque no setor, as mulheres estão em todas as pontas, do campo à xícara. “Somos mais questionadas, como em qualquer carreira, mesmo com uma formação de excelência e todo o estudo que o café exige e, mais ainda, se ganhamos evidência”, conta a barista, mestre de torra Isabela Raposeiras, empresária fundadora do Coffee Lab, em São Paulo, expoente do café especial no país e no mundo. Isabela é uma das mais importantes representantes do movimento que trouxe o café especial para a cena gastronômica e cultural do país, há 20 anos. Ela é convidada do festival para falar sobre “O Sucesso do Café Especial no Brasil”. Raposeiras tem muita história, em sua trajetória com a bebida. Uma delas é ter estado frente a frente com Erna Knutsen, em um evento em Oslo (Noruega), no ano de 2002, quando a senhora então com 80 anos se aproximou do estande brasileiro da BSCA – Brazilian Specialty Coffee Association e pediu um cappuccino à jovem barista. Isabela conta que aquela mulher, que ela desconhecia à época, voltou e agradeceu “o melhor cappuccino que já tinha bebido na vida”. Erna viveu até os 96 anos, Isabela, com 27, era a barista campeã brasileira competindo no Mundial em Oslo e o café especial do Brasil dava passos importantes no caminho do reconhecimento e entendimento que começa a ter.

Nascida no Rio, Raposeiras viveu em Brasília, em Porto Alegre, nos Estados Unidos e na Europa, fincando pé na capital paulista para empreender com o café. Apaixonada por máquinas e ferramentas, ela pilota aviões, pensa em comprar um novo ultraleve, fuma charuto só ou com amigues e reconhece: “Os homens se sentem ameaçados e nos infantilizam em simples situações profissionais”. Nas conversas técnicas, como quando precisa resolver um problema no torrefador, ela lembra de ter sido interrompida ou ignorada como se não entendesse do assunto. “Então começo a falar de aviões, de motores, de física, coisas que eles mesmos não conhecem”. Segundo ela, essas atitudes “fazem parte do habitual men´s planning”.

ALIANÇA

Mariana Proença, jornalista paulistana

“A mulher sempre teve forte presença em todas as etapas da cadeia produtiva do café”, conta a jornalista paulistana Mariana Proença, que estará no Cafestival apresentando painel sobre Mercado e Tendências. Mariana foi diretora de conteúdo da Café Editora por 16 anos, responsável, dentre outros projetos, pela redação da Revista Espresso e a edição de livros publicados sobre o tema. Presença definitiva em eventos nacionais e internacionais na agroindústria do café, ela desenvolve, desde a primeira edição, a curadoria da maior feira de cafés especiais do País: a Semana Internacional do Café – SIC. É uma das idealizadoras do Prêmio Coffee of The Year, para produtores brasileiros, e do Encontro da Aliança das Mulheres do Café, IWCA Brasil – International Women’s Coffee Alliance. Os pilares da aliança internacional são o empoderamento das mulheres que fazem parte da comunidade do café na conquista de uma vida sustentável e com propósito. “É preciso destacar essa força feminina no setor”, ressalta a jornalista. “O café propõe constantes mudanças: desde as formas de produzi-lo até as maneiras de consumi-lo”, explica Mariana, “e são o olhar detalhista e a atitude aberta que a mulher possui que a tornam peça-chave na indústria”. A IWCA foi criada em 2003, em encontro na Nicarágua – hoje congrega mais de 30 países e o maior grupo é do Brasil. “As histórias se repetem, só mudam o lugar e as personagens”, sintetiza Mariana.

FAZENDA

Ivanyse Borges de Carvalho Bernardes, na Fazenda Catiguá

Ivanyse está na Fazenda Catiguá, em Cambuquira (MG) cuidando de seus grãos amarelos e polpudos enquanto grava no celular um vídeo convidando a audiência para participar do Cafestival em Porto Alegre. A filha Giovanna, estudante de Agronomia na UFLA – Universidade Federal de Lavras, está junto. As duas são Q-Grader (se pronuncia quiu greider), especialistas em avaliar todos os atributos dos cafés conforme protocolo da SCA. Ivanyse fará parte do grupo de bate-papo entre produtores no festival – chega em Porto Alegre com o marido e o casal de filhos e depois do evento vai tirar férias na Serra Gaúcha. “O café exige muito cuidado e capricho, são características femininas”, fala a ex-funcionária concursada do Ministério Público, graduada em Direito e Administração, exonerada para assumir por escolha própria a fazenda da família e o cultivo do café. Ivanyse viveu na fazenda até ir para a escola e sem sair da região nunca parou de estudar. Com o café fez o mesmo: ao deixar a carreira de 10 anos no MP para recuperar o plantio de café que não estava indo bem na fazenda do pai, foi estudar. “Comecei os cursos de classificação para melhorar a qualidade do grão”, ela relembra. É membro da IWCA – serena e confiante, sabe da importância da mulher no setor. “Somos firmes e temos essa preocupação em cuidar e ensinar: a presença feminina é positiva para o mundo do café”. Apoiada integralmente pelo marido e a família, incluindo o pai, resistente no princípio, ela traça os passos para o crescimento dos negócios e acaba de inaugurar uma cafeteria dentro da Fazenda Catiguá buscando ampliar a experiência dos profissionais e os turistas com seus cafés.

CIDADE

Julia Limp e Juliana Suman, da Poza Café

As sócias Juliana Suman e Julia Limp inauguraram o Poza Café em Porto Alegre em 2020, um pouco antes da pandemia do Covid-19 forçar o isolamento e o fechamento dos estabelecimentos na cidade e no país. O casarão antigo localizado na verdejante Rua Gonçalo de Carvalho abriga o sonho da dupla de servir cafés de qualidade em um ambiente amigável e acolhedor, rodeado pela natureza do jardim aos fundos e com comidinhas saudáveis e deliciosas que preparam. Está tudo lá, coroado com o toque feminino que faz a diferença. “O café especial nos trouxe até aqui”, conta Juliana, arquiteta e estudante de Odontologia, curso que não concluiu ao encontrar o café especial e a proposta de Julia para juntas empreenderem no setor. A cachorrinha Judith é outra garota que compõe a família Poza: ela recebe com elegância todos os clientes e com alegria os peludos da sua turma. As Ju, como são conhecidas, organizaram um campeonato de latte art só para mulheres do café, este ano, e puderam sentir “a energia que se espalha quando estamos juntas na mesma missão”. “Fazemos por todas”, diz Juliana, “o movimento inspira outras mulheres para empreender e estar à frente de seus negócios”.

CULTURA

Margaret Dorneles, da Baden Cafés

Pioneira, Margaret Dorneles inaugurou sua cafeteria há 10 anos no bairro Santana. Jornalista também formada em História e apaixonada por cafés, durante quatro anos ela estudou o grão, os métodos, visitou fazendas e decidiu levar cafés especiais para Porto Alegre. A cafeteria ganhou nome de cidade alemã mas na verdade é uma homenagem carinhosa para um dog que fez parte da família, o Baden. Em seguida veio a ideia de ter um espaço cultural para receber autores, artistas e muitos interessados em fazer lá lançamentos e autógrafos – aí nasceu o Espaço Amelie (outra pet, da filha), dedicado à Cultura, referência na cidade.

“No início pensei que a Baden poderia ser um espaço para mulheres e suas crianças, com tranquilidade para se demorar sem se preocupar em sair, como acontece nos restaurantes”, conta a empreendedora. “Logo percebi o caráter democrático do café: ele é para todos”, resume.

Foi assim, próximo ao café e aos negócios da mãe, que entrou um homem nessa história: Guert Schinke é engenheiro agrônomo, se tornou barista e mestre de torra, proprietário da Baden Torrefação e Café, espaço que ele conquistou com independência e profissionalismo. A Baden Torrefação é fornecedora de cafés para muitos estabelecimentos na cidade e no estado do Rio Grande do Sul e Guert, um dos criadores do Cafestival.

 

PROGRAMAÇÃO

PALESTRAS NO CAFESTIVAL

9h – 9h45 – Palestra: Por que compramos? Entendendo o comportamento do novo consumidor. Com Marcos Tonin, do SEBRAE.

10h – 11h – Bate-papo produtores: com Ivanyse Bernardes, da Fazenda Catiguá (Serra da Mantiqueira/Sul de Minas), Elder Moscardini, do Café Moscardini (Alta Mogiana/SP), e Edimar Miranda, Rochedo Cafés Especiais (Araponga/MG).

11h15 – 11h45 – Palestra: Empreendedorismo – Por que abrir (ou não) uma cafeteria? Com Flávia Pogliani, economista e barista fundadora da cafeteria The Little Coffee Shop, em São Paulo (SP).

11h45 – 12h45 – Bate-papo cafeterias: com Sharon Hopperdizel, do Vive le Café, João Otto, da OhBruder, e o casal Letícia e David, do LuciaMaria Cafés de Origem, na Casa de Cultura Mario Quintana.  

13h – 13h45 – Palestra: O sucesso do café especial no Brasil, com Isabela Raposeiras, uma das responsáveis pelo café especial do Brasil estar hoje na xícara e no paladar brasileiro e do mundo. Há 22 anos, Isabela iniciou essa jornada levando apoio e conhecimento para os pequenos produtores e trazendo novas experiências com a bebida para o consumidor. Um trabalho de educação e de formação desse mercado, jovem e pujante. Criadora do Coffee Lab, cafeteria e escola em Pinheiros (São Paulo), Raposeiras e seu time já formaram mais de 10 mil profissionais e amantes do café. As inovadoras propostas de consumo, a disciplina dos negócios e muita coragem levaram o empreendimento de Isabela a se tornar referência mundial e sua experiência, uma proposta que pode ser replicada – são mais de 30 projetos em que ela está e esteve como consultora: de cafeterias, cardápios e posicionamento de marca a fazendas de cultivo. Isabela estará no 2º Cafestival Poa contando sua história com o grão que faz parte da própria história do café especial no Brasil.

14h – 14h45 – Palestra: Tendências – Mercado e consumo, com Mariana Proença, jornalista, consultora especializada em café, curadora da maior feira de cafés especiais do País: a Semana Internacional do Café – SIC, em Belo Horizonte (MG).

15h – 15h30 – Palestra: Leite Animal – Processos e necessidades para o desenvolvimento de leite de alta qualidade, com Luciano Persico, Gerente Industrial do Leite Trevisan (Farroupilha – RS).

15h45 – 16h45 – Palestra: Leite Vegetal + Sustentabilidade, com Pedro Lisboa, Head of Coffee Relations na Nude – Plant Based Foods.

16h30 – 17h15 – Bate-papo torrefações, com Clóvis Althaus, do Café do Mercado, Gustavo Albuquerque, da William & Sons, e Paula Anele, da Guria Coffee Roasters.

17h30 – 18h15 – Palestra: Responsabilidade Social – O Café transforma vidas, com Paulo Gabriel, barista e gestor de treinamento da rede Sofá Café (SP), coordenador do Projeto Fazedores de Café, que tem como missão formar pessoas em vulnerabilidade social na profissão de barista.

18h30 – 19h30 – Bate-papo baristas: com Daniel Busch, bicampeão brasileiro de Latte Art, em 2015 e em 2018, Isis Rodrigues Correa, do Mercado Brasco, Ricardo Telles, do Café do Mercado, e Gabriela Giurno, do LuciaMaria.

OFICINAS NA COZINHA-SHOW

Todas as oficinas são pagas e incluem o acesso ao Cafestival. As oficinas podem ser adquiridas em combos com desconto, combinando dois programas.

Análise sensorial – “A Química e a Física do café”, com Verônica Belchior – uma imersão com duas horas de duração para conhecer os elementos que compõem o grão e que resultam na bebida prazerosa e benéfica para o organismo e o cérebro. Da acidez ao frescor do grão, da torra aos métodos de extração, a química e a física do café. Cupping (degustação de cafés) guiado pela ministrante Verônica, que é Q-Grader, PhD em Ciência de Alimentos e Mestre em Ecologia e Biologia. R$ 180

11h15 – 12h30 – Escrita Criativa – “Viajando com o café”, com Luis Roberto Amabile e Luiza Estima. Uma aula inspirada por viagens e cafés, iniciando com a jornada do grão pelo mundo, saindo da África até chegar ao Brasil, narradas pela jornalista Luiza Estima, com técnicas de escrita criativa conduzidas pelo professor, escritor e Doutor Luís Roberto Amabile. Inspirados pela bebida e as histórias, os participantes irão produzir seus relatos pessoais de cafés e cafeterias queridas, com a proposta de postar seus textos. R$ 180

13h – 14h30 – Cozinha – “Uma receita com café”, com Eduardo Leling e a turma da Unisinos. Eduardo é chef de cozinha formado em Gastronomia e Mestre em Nutrição e Alimentos pela Unisinos, onde é professor de Técnicas Gastronômicas Europeias, de Gastronomia Brasileira e Zitogastronomia (estudo das cervejas) – é Beer Sommelier formado pela Doemens Academy, na Alemanha. Esta aula terá degustação da receita: um sanduíche no melhor estilo buraco quente com um dry rub de café na carne. O workshop traz também uma harmonização de café com queijos, como uma surpreendente entrada. R$ 180

15h – 16h – Café – “Arte, sabor e criatividade” – com Paulo Gabriel. Paulo é formado em Gastronomia, estudante de Engenharia de Alimentos e barista – ele vai preparar bebidas criativas com ingredientes incomuns – e todos deliciosos. Não perca, tem degustação! R$ 120

16h30 – 17h30 – Chocolate: “Harmonização com cafés” – André Passow é chocolate maker e nessa oficina vai harmonizar chocolates com cafés e preparar uma receita mesclando os sabores dos dois produtos. Tem degustação e receitas! R$ 120

18h – 19h – Drinques: “Coquetelaria do café” – bartender e barista, Mari é amazonense e atua como barista em Brasília há algumas safras. Foi por causa do café que se interessou pela coquetelaria e pela complexidade sensorial dos destilados. Aí juntou tudo num drinque e segue promovendo a interação entre bebidas interessantes, ingredientes brasileiros e cafés especiais. Mari recém conquistou medalha de prata no Coffee in Good Spirits, campeonato que une taças e xícaras em bons drinques com café. Muitos sabores neste workshop – saúde! R$ 120

19h15 – 21h15 – (TURMA EXTRA) Análise sensorial – “A Química e a Física do café”, com Verônica Belchior – imersão para conhecer os elementos que compõem o grão e que resultam na bebida prazerosa e benéfica para o organismo e o cérebro. R$ 180,00

2º CAFESTIVAL POA – Dia 9 de outubro, domingo, das 9h às 19h, Mercado Paralelo/ DC Shopping (Rua Frederico Mentz, 1561 – 4º Distrito – Porto Alegre/RS)

Ingressos https://bit.ly/3deLC6z – pagamentos com PIX, cartões de crédito e débito e boleto.

 

Texto escrito por Luiza Estima

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