As irmãs Rita e Rose Machado fundaram em 2020 a escola de estudos feministas “As Pensadoras”, que já atraiu milhares de alunas de 14 países, para ajudar na redução da desigualdade de gênero por meio da formação intelectual democrática. 

O feminismo nunca virou pauta de tantas discussões, das timelines aos discursos políticos, possivelmente baseadas em “novas ondas” de movimentos feministas que têm se utilizado principalmente das redes sociais para mobilização e debate sobre seus direitos, igualdade salarial, aborto, violência doméstica e assédio. Se você é mulher, certamente já se sentiu impactada por alguma dessas questões ou tem histórias familiares nesse sentido.

Mas o que significa afinal ser feminista? Existem movimentos que tentam desqualificar quem luta por essa causa, desde os tempos das sufragistas, que lutavam pelo direito das mulheres ao voto no século 19 e ainda não utilizavam  essa  expressão. Talvez por ser uma questão incômoda, por mexer com uma cultura arraigada. Ser feminista, na verdade, significa fundamentalmente, acreditar que homens e mulheres deveriam ter os mesmos direitos e serem tratados de forma igualitária. Não está atrelado à orientação sexual, nem à forma de se vestir, muito menos supõe ódio aos homens. Feministas podem ou não ser casadas, podem ou não ter filhos. Ser feminista é simplesmente ter o direito de decidir como estar no mundo. 

Mulheres que lutam com mulheres

Feita a introdução sobre o feminismo e a importância do entendimento de que as mulheres não gozam dos mesmos privilégios que os homens desde que o mundo é mundo, chegamos a As Pensadoras. Em março de 2020, a professora de filosofia da Universidade Estadual do Amazonas, a gaúcha Rita de Cássia Machado foi de Tefé (AM), onde reside com os filhos adolescentes Sofia, Santiago e Bernardo, para mais perto da família, em Tramandaí, em razão da pandemia. Integrante da Rede Brasileira de Mulheres Filósofas, Rita ofereceu na época um curso online que tinha o objetivo de estudar mulheres intelectuais. De forma surpreendente, mais de 800 mulheres participaram. 

Rita de Cássia Machado

“Com o sucesso tão rápido, o projeto ganhou corpo, e se tornou uma Escola de formação, passando a propor também estudos sobre o pensamento de mulheres invisibilizadas e desconhecidas na história do pensamento humano.

No meio do ano passado, em agosto, após outros estudos entrarem no portfólio, foi a vez do curso sobre ‘As Pensadoras Negras’ esgotar todas as inscrições em pouquíssimo tempo”, conta Rita. 

Conhecimento como arma

“As mulheres sempre fizeram parte do universo intelectual, das artes, das ciências, da filosofia, da música. No entanto, ao longo da história, suas obras foram ignoradas ou mesmo atribuídas a homens. Por conta disso, encontrar referências femininas, figuras que despontam por sua atuação, seja no mundo acadêmico ou no universo cultural, segue sendo um desafio até hoje”, destaca Rita. E com o objetivo de evidenciar o trabalho de muitas dessas mulheres, ela e a irmã Rose Machado, deram um passo importante para contribuir com a ocupação de mais espaços e dar luz a tantas mulheres que merecem ser vistas. Numa contraproposta a “Os Pensadores”, famosa coleção que reúne algumas das principais obras da história da filosofia, apenas as assinadas por homens, surgiu “As Pensadoras”. 

Rose Machado

“A história do pensamento também tem mulheres, e grandes mulheres! Por isso, estamos trazendo essas pensadoras para que todos tenham acesso e possam estudar sobre elas e seus legados”, afirma a coordenadora da Escola, Rita Machado.

E são elas que embasam os estudos da instituição. Desde o início de 2021, já estão sendo debatidos temas como Mulheres no Cinema, Feminismo Socialista, Teologia Feminista, além de estarem previstos cursos sobre Ecofeminismo, Violências de gênero, Pensadoras negras brasileiras, Movimento lésbico, todos conduzidos por professoras doutoras de universidades de diferentes regiões do país, e um Fórum que ocorrerá ainda em fevereiro. Os valores arrecadados nas taxas de inscrições são doados parcialmente a projetos sociais feministas. A Escola conta ainda com o projeto de uma editora e já lançou uma livraria feminista, totalmente digital, com obras complementares ao conteúdo das capacitações.

Para fazer parte d´As Pensadoras não precisa ser acadêmica, mas se interessar pelos temas de classe, raça e gênero, querer conhecer e aprofundar o conhecimento.

“Aqui é um lugar plural, coletivo e interdisciplinar em que as mulheres de todos os cantos do país e que estão no exterior, são bem-vindas, pois entendemos que a formação intelectual das mulheres é uma das formas para a diminuição da desigualdade de gênero”, reforça Rita. 

Propósitos e sonhos compartilhados

Formada pela Unisinos em 2006 em Filosofia, Bacharel e Licenciada, Rita, de 39 anos, tem pós, mestrado e doutorado pela UFRGS, além de pós-doutorado pela Unisinos. A vida acadêmica começou aos 17 anos, como bolsista de iniciação científica.  Rose tem 35 anos, é mãe de Cícero, de 11 anos, e Laura, de três meses. Profissional da área da Administração, casada com Luis, colorada fanática, filha mais nova de funcionários públicos e uma pessoa que odeia injustiça, como ela mesma diz. Atua há 12 anos na área da Saúde e possui formação acadêmica também nessa mesma área. 

A avó, Risolina Fraga, é a inspiração das netas para a vida e para a criação da escola. “Ela era formidável. Ensinou autonomia, valor do trabalho, deu segurança para tudo, inclusive para estudarmos”, garante Rita. Também foi uma das molas propulsoras para as irmãs dedicarem-se a uma causa de libertação das mulheres. “Minha avó materna, meu exemplo de mulher, sofreu muitas violências, mas sempre se impôs com muita sabedoria e nos ensinou a sermos iguais, com muito afeto e carinho. Minha mãe seguiu a história de violência, mas foi em busca da sobrevivência sua e de suas filhas”, afirma Rose.

Apesar do pouco tempo desde a criação, a escola já tem mobilizado as irmãs a dar início a novos projetos. O próximo passo é transformá-la em Comunidade. “Reuniremos todas as mulheres engajadas para disponibilizar ainda mais conteúdo e despertar a consciência do maior número de mulheres possível”, afirma Rose. “O despertar feminista só vai ser feito de forma coletiva. O machismo é tão forte que cria novas culturas. Constrói a cultura do estupro, do assédio. Não pode ser normal uma mulher ser julgada pelo batom que usa, pela roupa que usa, e não pela capacidade profissional e acadêmica. O feminismo é o que temos para combater esses tipos de violências, para nossa emancipação como mulheres e para a luta por igualdade de gêneros”, finaliza Rita.

Saiba mais

Website As Pensadoras
Instagram As Pensadoras

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